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[Volta aos livros em 80 mundos #5: Bélgica] O Quarto Azul – Georges Simenon

Primeiramente, preciso esclarecer que, embora seja belga, Simenon escreveu muitos livros passados em outros países, principalmente na França, como acabou sendo o caso desse. Portanto, eu não sei se considero esse livro representativo ou não da cultura belga. Pois, apesar de não se passar no país, o próprio autor é, de fato, uma das maiores referências literárias do país. Mas vamos ao conteúdo do livro.

Apesar de não ser parte das histórias protagonizadas pelo comissário Maigret, o personagem mais famoso do autor, este livro tem um forte componente policial. Isso porque a trama gira em torno de um caso extraconjugal que ganha contornos policiais quando o marido da amante aparece morto repentinamente e a culpa provável recai no casal de amantes. A partir deste ponto, acompanhamos Tony Falcone tentando se defender e, a partir disso, nos revelando detalhes do seu quase um ano de relacionamento com Andrée e dos eventos surpreendentes que levarão à sua prisão.

E é nesse momento que o talento do autor para escrever suspenses e policias vem à tona. Pessoalmente, eu nem estava tão interessada assim no relacionamento dos dois, mas a escrita é tão poderosa em sua intenção de puxar o leitor e fazer despertar sua curiosidade que, a partir de certo ponto, você não consegue parar de ler. Você precisa entender o que está acontecendo e até que ponto Simenon irá ou não fechar essa história de maneira redonda.

“Como a vida é diferente quando a vivemos e quando a dissecamos a posteriori! Ele acabava por se deixar perturbar pelos sentimentos que lhe imputavam, por não distinguir mais o verdadeiro do falso, por se perguntar onde terminava o bem e onde começava o mal”.

Um ponto sobre o qual venho refletindo desde que concluí a leitura é que, durante toda a narrativa, vemos apenas o lado dele, Tony, mas nunca a perspectiva de Andrée. Será igual? Ou temos diante de nós um caso semelhante ao encontrado no Dom Carmurro, de Machado de Assis? Ele enganava ela? Ela enganava ele? Havia alguém sendo enganado de fato ou os únicos enganados nesta história somos nós, os leitores?

De uma coisa, porém, podemos ter certeza: a linha narrativa de Simenon trabalha com a ideia de pessoas que, meio que sem querer, se veem envolvidas em algo muito maior do que pretendiam. E qual de nós já não se viu, sem perceber, em algo maior do que pretendia, para o bem ou para o mal?